Sobre ‘Simulação de um levante’5 anos da tragédia de BRUMADINHO
No dia 25 de janeiro de 2024, quando o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho completou 5 anos, uma performance na Avenida Paulista, um dos principais cartões postais da cidade de São Paulo, homenageou as 272 vítimas fatais da lama tóxica
I
O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.
II
Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!
III
A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.
IV
Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro?
Lira Itabirana, de Carlos Drummond de Andrade*
Por Gabriela Leirias
Rio Doce, Watu para o povo Krenak, não é somente um curso d’água para abastecer as cidades, é um parente, avô.
Avôs, pais, mães, tios, parentes presentes na Avenida Paulista. São rios, linhas, fitas, tramas, elos de existências.
Ritos podem ser portais que nos conectam com o invisível, com os que não estão mais presentes.
Rito, celebração, ação, revolta.
Este rito que vivemos hoje é também denúncia e enunciação.
Tragédia que não pode ser esquecida, vidas-existências que não podem ser esquecidas. Humanas e não humanas, são tantas, algumas podemos nomear, quantificar, mas muitas invisíveis e sem nome.
Hoje, dia 25 de janeiro de 2024, homenageamos com a performance “Simulação de um levante”, na Avenida Paulista, um dos principais cartões postais de São Paulo, as 272 vidas perdidas na tragédia de Brumadinho. Cada pessoa na rua segurou pelo menos uma fita vermelha com o nome de uma vítima, assim, nos conectamos a elas e celebramos sua existência.
As canções de Milton Nascimento ‘Promessa do Sol’, ‘Cio da Terra’ e ‘Coração Civil’, que fazem parte da memória afetiva de muitos, ganharam sentido renovado e atualizado. Uma tarefa difícil: cantar. A voz, em muitos momentos trêmula, fraqueja num jorro de emoção. Mas novamente se fortalece, afinal são muitas vozes juntas, vidas a lembrar, denúncias a fazer:
“Que tragédia é essa que cai sobre todos nós!
Que tragédia é essa que cai sobre todos nós!”
Ecoa pela Avenida Paulista, um dos locus do capital no Brasil. “Um aglomerado de minérios”, que nos lembra o videoartista Flavio Barollo do coletivo se(cura) humana, autor da performance “Simulação de um levante”, , que nos lembra o videoartista Flavio Barollo do coletivo se(cura) humana, um dos autores da performance “Simulação de um levante”, ao lado de Malu Avelar e Wellington Tibério.
E a pergunta: qual a relação deste lugar com esta tragédia? Com estas 272 mortes?
A mineração, de um passado nefasto que forja uma ideia de nação pela violência, aponta para um futuro terrível.
Hoje são, segundo a Agência Nacional de Mineração (jan/2024), 464 barragens cadastradas no Brasil, sendo 92 em situação de alerta e 67 em alto risco de insegurança. A tragédia é hoje e pode se propagar.
O que a mineração alimenta, qual modo de produção, qual modo de vida?
Insistiremos neste caminho a preço de quem, de quais vidas?
A mineração que alimenta as aceleradas necessidades contemporâneas.
Existe Rota de Fuga?
Da Paulista, nos conectamos com Minas Gerais. Minas é aqui. Amazônia é aqui, os biomas do cerrado, caatinga, mata atlântica, estão aqui, implicados. A violência da exploração da terra é assunto de todes.
E a arte e o ativismo, nas suas múltiplas formas e linguagens somadas, podem ter a potência de tornar visíveis as vidas ceifadas e as violências. Violências atualizadas. O território está em disputa, há de se olhar para além da lógica extrativista, paisagens e territórios em risco. Se o território está em risco nós também estamos.
Ao longo do trajeto na Paulista, com as fitas vermelhas na mão, as palavras do coletivo (se)cura humana, em especial a artista mineira Malu Avelar, nos convoca a criar outras narrativas da história do país. “O rastro da mineração, a Estrada Real, as estradas históricas que cortam Minas e todo o país, são rastros de subjugo de populações indígenas e do povo negro trazido para o trabalho à força”. Sem o romantismo é preciso ter coragem de contar esta história de outro modo, por que elas apontam para o nosso futuro, e ele seguirá como?
Na Avenida Paulista a sirene tocou às 12h28, hora em que houve o rompimento da Barragem de Brumadinho. O silêncio imperou, somos tomados pela dor, a imagem de horror da tragédia.
Em 2019 a sirene não tocou para alertar a evacuação e, mesmo se tocasse, qual seria o tempo para abandonar a casa, a vida. Qual o valor da vida? Como quantificar a perda da vida, da terra, da casa. Da montanha, do rio, dos peixes. Das espécies que nem conhecemos ainda.
Estamos no caminho da extinção das espécies e da nossa própria extinção.
É possível reparação? As tragédias de Brumadinho, Mariana, não foram acidentes.
Não há rota de fuga.
No dia 25 de janeiro de 2024, quando o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho completou 5 anos, uma performance na Avenida Paulista, um dos principais cartões postais da cidade de São Paulo, homenageou as 272 vítimas fatais da lama tóxica
I
O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.
II
Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!
III
A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.
IV
Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro?
Lira Itabirana, de Carlos Drummond de Andrade*
Por Gabriela Leirias
Rio Doce, Watu para o povo Krenak, não é somente um curso d’água para abastecer as cidades, é um parente, avô.
Avôs, pais, mães, tios, parentes presentes na Avenida Paulista. São rios, linhas, fitas, tramas, elos de existências.
Ritos podem ser portais que nos conectam com o invisível, com os que não estão mais presentes.
Rito, celebração, ação, revolta.
Este rito que vivemos hoje é também denúncia e enunciação.
Tragédia que não pode ser esquecida, vidas-existências que não podem ser esquecidas. Humanas e não humanas, são tantas, algumas podemos nomear, quantificar, mas muitas invisíveis e sem nome.
Hoje, dia 25 de janeiro de 2024, homenageamos com a performance “Simulação de um levante”, na Avenida Paulista, um dos principais cartões postais de São Paulo, as 272 vidas perdidas na tragédia de Brumadinho. Cada pessoa na rua segurou pelo menos uma fita vermelha com o nome de uma vítima, assim, nos conectamos a elas e celebramos sua existência.
As canções de Milton Nascimento ‘Promessa do Sol’, ‘Cio da Terra’ e ‘Coração Civil’, que fazem parte da memória afetiva de muitos, ganharam sentido renovado e atualizado. Uma tarefa difícil: cantar. A voz, em muitos momentos trêmula, fraqueja num jorro de emoção. Mas novamente se fortalece, afinal são muitas vozes juntas, vidas a lembrar, denúncias a fazer:
“Que tragédia é essa que cai sobre todos nós!
Que tragédia é essa que cai sobre todos nós!”
Ecoa pela Avenida Paulista, um dos locus do capital no Brasil. “Um aglomerado de minérios”, que nos lembra o videoartista Flavio Barollo do coletivo se(cura) humana, autor da performance “Simulação de um levante”, , que nos lembra o videoartista Flavio Barollo do coletivo se(cura) humana, um dos autores da performance “Simulação de um levante”, ao lado de Malu Avelar e Wellington Tibério.
E a pergunta: qual a relação deste lugar com esta tragédia? Com estas 272 mortes?
A mineração, de um passado nefasto que forja uma ideia de nação pela violência, aponta para um futuro terrível.
Hoje são, segundo a Agência Nacional de Mineração (jan/2024), 464 barragens cadastradas no Brasil, sendo 92 em situação de alerta e 67 em alto risco de insegurança. A tragédia é hoje e pode se propagar.
O que a mineração alimenta, qual modo de produção, qual modo de vida?
Insistiremos neste caminho a preço de quem, de quais vidas?
A mineração que alimenta as aceleradas necessidades contemporâneas.
Existe Rota de Fuga?
Da Paulista, nos conectamos com Minas Gerais. Minas é aqui. Amazônia é aqui, os biomas do cerrado, caatinga, mata atlântica, estão aqui, implicados. A violência da exploração da terra é assunto de todes.
E a arte e o ativismo, nas suas múltiplas formas e linguagens somadas, podem ter a potência de tornar visíveis as vidas ceifadas e as violências. Violências atualizadas. O território está em disputa, há de se olhar para além da lógica extrativista, paisagens e territórios em risco. Se o território está em risco nós também estamos.
Ao longo do trajeto na Paulista, com as fitas vermelhas na mão, as palavras do coletivo (se)cura humana, em especial a artista mineira Malu Avelar, nos convoca a criar outras narrativas da história do país. “O rastro da mineração, a Estrada Real, as estradas históricas que cortam Minas e todo o país, são rastros de subjugo de populações indígenas e do povo negro trazido para o trabalho à força”. Sem o romantismo é preciso ter coragem de contar esta história de outro modo, por que elas apontam para o nosso futuro, e ele seguirá como?
Na Avenida Paulista a sirene tocou às 12h28, hora em que houve o rompimento da Barragem de Brumadinho. O silêncio imperou, somos tomados pela dor, a imagem de horror da tragédia.
Em 2019 a sirene não tocou para alertar a evacuação e, mesmo se tocasse, qual seria o tempo para abandonar a casa, a vida. Qual o valor da vida? Como quantificar a perda da vida, da terra, da casa. Da montanha, do rio, dos peixes. Das espécies que nem conhecemos ainda.
Estamos no caminho da extinção das espécies e da nossa própria extinção.
É possível reparação? As tragédias de Brumadinho, Mariana, não foram acidentes.
Não há rota de fuga.
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