Carta sobre Brumadinho é lida em Exposição Over (The) Mine, em Munique

Assinado pela AVABRUM, documento foi lido por artistas e também ficou à disposição para a leitura dos visitantes

A arte deixa marcas e ressignifica. A arte pode transformar o futuro, ao expor as feridas do passado e do presente. É esta conexão que nos aproxima aqui, hoje. É esta conexão que rompe os 9.390 quilômetros que separam Brumadinho de Munique.

Ficamos gratos e sensibilizados com o tema escolhido para esta exposição que toca nossos corações, celebra a memória e nos desafia, juntos, a desmontar as estruturas do poder econômico e a engrenagem predatória das empresas mineradoras. Antes que seja tarde. Agradecemos, portanto, a todos que contribuíram para que este evento fosse realizado.

A AVABRUM – Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão – nasceu da dor. No dia 25 de janeiro de 2019, quando a barragem da Vale se rompeu, 272 pessoas tiveram suas vidas interrompidas – aí incluindo Lorenzo e Maria Elisa, bebês que estavam no ventre de suas mães. Naquele dia, nós, os familiares, também tivemos as nossas vidas interrompidas.

Precisávamos processar a dor e o luto. Precisávamos entender o que havia acontecido e esta foi a pior parte. A pior parte nos deixou indignados e aumentou nosso sofrimento. Acreditávamos que os nossos familiares estavam em ambiente seguro, porque, mesmo depois de muitos avisos e advertências, as empresas diziam que a barragem não corria riscos.

Carta da AVABRUM e vídeo do rompimento ficaram na entrada da exposição

Mas a mina não era segura, como comprovaram as investigações da Polícia Federal e a atuação do Ministério Público nos inquéritos policiais. O laudo da Tüd Süv atestava um padrão de estabilidade que não era verdadeiro. Aliás, a multinacional alemã é citada negativamente mais de mil vezes no relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados que apura as responsabilidades sobre a tragédia de Brumadinho. Na página 561 uma passagem chama a atenção:

“Vê-se, portanto, que a TÜV SÜD não demonstrou nenhum intuito de colaborar com as investigações dos fatos; ao contrário, age deliberadamente no sentido de dificultar qualquer tentativa de elucidação dos fatos que levaram à morte centenas de pessoas em Brumadinho.”

A violência e a brutalidade que atingiu nossos entes queridos poderia ter sido evitada. Esperamos que a Justiça alemã possa responsabilizar os que trataram a vida humana com desprezo. Sabemos que 272 vidas humanas foram mortas por negligência, descaso com a vida e ganância.

Por isso, esta exposição também nos inquieta. Desperta a indignação e nos move a lutar contra os que, de forma sórdida e impiedosa, cometem crimes contra a vida humana e contra o meio ambiente.

Os trabalhos expostos, aqui, da Isadora Canela, Lis Haddad e Thais Paiva Machado, nos inspira e nos estimula na realização do Projeto Legado de Brumadinho, idealizado pela AVABRUM. É um movimento que busca tocar toda a sociedade, todos os que nos ouvem pelo Brasil afora e pelo mundo. O convite que fazemos é: escutem a nossa voz e gritem conosco. Aqui em Munique, nesta exposição, sentimos que nossas vozes estão presentes. Muito obrigada.

A solidariedade tem a força de transformar a realidade. A arte, por sua vez, protesta e faz a conexão entre Brumadinho e Munique. Que juntas, estas comunidades possam compartilhar o sonho de justiça e o triunfo da vida sobre os semeadores do mal.   

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